domingo, 23 de maio de 2010

Será um típico típico trabalhador ou empresário brasileiro?


Nelson é um guardador de carros de rua. Ele é visto, diariamente, em um quarteirão em frente ao meu local de trabalho, próximo a um dos hospitais mais movimentados de Porto Alegre. É mais um desses "flanelinhas" que pedem dinheiro, quando você estaciona o carro em seu "território". Agora ele é cadastrado pela Prefeitura Municipal, pois aqui em Porto Alegre os guardadores de carro ou "flanelinhas" são regulamentados, usando uniforme e crachá. Ele não cobra uma taxa fixa por estacionamento, ou seja, o motorista dá quanto quiser. Em geral, as pessoas dão desde moedas até notas de R$ 2,00 ou R$ 5,00, conforme o tipo de freguês. Além de guardar os carros, ele também presta um serviço de lavagem de carros, cobrando R$ 10,00 por lavagem, que é o único serviço com taxa fixa. Não sei de onde ele tira a água para lavar os carros, mas, provavelmente, de alguma torneira de uma das duas empresas que possuem sede no quarteirão que faz parte de sua jurisdição.

Conheço o Nelson há 10 anos, desde quando ele se estabeceu como guardador de carros em frente ao meu local de trabalho. Mas ele chamou-me mesmo a atenção um dia em que uma mulher apareceu no "seu local de trabalho" com duas meninas beirando os 04 anos de idade, cobrando pensão alimentícia atrasada. Após uma pequena discussão, e diante da negativa de levar algum dinheiro, a mulher subiu em um caixote e começou a gritar, fazendo um discurso em frente ao prédio da minha empresa, que deve ter umas 300 pessoas como espectadoras, blasfemiando todo o tipo de impropérios contra ele. Quando ela faz isso, para acalmá-la, ele sempre dá um dinheiro a ela, fazendo com que ela pare de gritar e vá embora. Teve uma vez que, inclusive, ela chamou a Brigada Militar (Polícia Militar do RS), a qual levou o Nelson preso, pois a mulher havia alegado que ele a tinha ameaçado com uma faca. Não sei se o Nelson a ameaçou mesmo, pois a faca que ele usa é uma faquinha pequena dessas de serrina, que ele usa para descascar frutas, coisa que eu por diversas vezes presenciei. Enfim, acho que ele já aprendeu a lição, pois faz muitos anos que ela não vai lá dar seu espetáculo gratuito para seus quase 300 espectadores. As duas filhinhas dele hoje estão com 08 e 06 anos, e são vistas pelo menos um dia da semana com ele, provavelmente, seu dia de visitas. As meninas são educadinhas, pois sempre a partir das 17h30min, que é o horário de término da jornada de trabalho da minha empresa, ficam no portão de saída dizendo para as pessoas: - Boa noite e bom descanso.

Um grande número de pessoas, além de dar o dinheiro do dia pela guarda dos carros, ajuda o Nelson e as meninas com roupas usadas e material escolar. Uma vez, uma das meninas ficou na minha volta, em frente a minha empresa, me pedindo dinheiro, quando foi repreendida pelo pai, que lhe disse: - Se tu ficares incomodando as pessoas, ninguém vai te dar nada na vida. Aquilo deixou-me pensando o que ele ensina para suas filhas. Na verdade, ele ensina o que ele pratica e acredita. Fiquei pensando se seria benéfico as pessoas darem dinheiro e roupas para o Nelson. Já escrevi em outro post sobre minha opinião de ser contra dar esmolas. Mas afinal de contas, o Nelson de alguma forma trabalha e merece ser recompensado pelo seu trabalho. Mas será que ele encara, realmente, aquilo como trabalho?

Não sei quanto o Nelson ganha, mas ele é visto todos os dias tomando cerveja após o expediente, em bares próximos dali, bem como almoça frequentemente no mesmo restaurante em que os funcionários da minha empresa almoçam. Um dia, saindo do almoço, vi ele recostando-se em uma cadeira dessas de lona, tipo "preguiçosa", para tirar uma "sesta". Passei por ele, quando o mesmo estava se acomodando na cadeira, e perguntei: - Ué, dormindo em horário de trabalho? E ele respondeu: - Estou em meu horário de almoço, e além do mais eu não tenho patrão, pois sou dono do meu próprio negócio. E eu tive que escutar essa calado, pois ele tinha toda a razão.

Certa vez, esperando um táxi na frente da minha empresa, para fazer um deslocamento em um serviço externo, conversei com o Nelson. Na ocasião, ele me disse que antes de ter seu "negócio próprio", trabalhou em uma metalúrgica com carteira assinada, na função de Auxiliar de Torneiro Mecânico, mas que como empregado ele ganhava muito pouco, quando comparado com o seu "próprio negócio". Disse-me na ocasião, que hoje ele mora em uma casinha modesta, em uma vila popular de Porto Alegre. Quando perguntei-lhe se ele morava sozinho, ele me disse que sim, e disse: - Aproveito a vida ao máximo, e nunca estou sozinho, pois sempre levo um corpinho diferente para casa.

Já vi, também, o Nelson ter um caso, apesar do seu jeito meio "maloqueiro", com uma estagiária, coisa mais linda, da empresa em que trabalho. Quando vi, não acreditei! Mas, várias vezes vi os dois abraçados e se beijando. Apesar de sua condição, o Nelson deve ter um bom papo com as mulheres.

Esse é o Nelson, um guardador de carros ou "flanelinha", que não declara imposto de renda, que não tem férias para não perder seu ponto, que teve dois "casamentos", que paga pensão alimentícia para duas filhas, e que vive a sua vida honestamente. Será um típico trabalhador ou empresário brasileiro?

16 comentários:

  1. Acho legal as pessoas ajudarem com roupas e tal, até porque, ele não está de braços cruzados apenas esperando ganhar.
    Agora... beijar a estagiária em frente ao local de trabalho (ou será q interpretei errado?) é demais! Hahaha!
    BjO*

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  2. Olá Paulo!
    Nelson é os dois, pode ter certeza...
    Bela postagem.
    Bjs
    Mila

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  3. Também achoq eu Nelson é os dois!
    assim como vc disse em meu comentário, posso me imaginar sentada escutando vc contar esta história, qe se eu quiser, se vc quiser, pode ser apenas uma doce história, vista por um ângulo diferente!

    Um Grande beijo e obrigada pela sua presença grandiosa em meu blog!

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  4. Paulo, obrigada pelas palavras carinhosas. A Nathália é uma gracinha, parece muito cativante!
    BeijO*

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  5. Bom dia, Paulo.
    Adorei a história do Nelson. Acho que ele é um típico trabalhador. É homem livre, e honesto. Só lhe resta cuidar-se bem, para não ter mais filhos. Senão, faltará dinheiro para a cervejinha, e etc...

    Um abraço.

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  6. Eu acho que é um empresário bem com a cara do brasil !
    Amei o texto ...
    Beijos

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  7. Boa noite, Paulo.
    Muito obrigada pela visita. Eu já estou lhe seguindo. É porque no link, aparece "Maria Auxiliadora de Oliveira"

    Gostei demais do seu jeito de escrever. Foi uma viagem. Me senti no meio de vocês, vendo de perto, o episódio todo. Parabéns!

    Um grande abraço.

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  8. Olá querido!
    Que história né?
    Acho que ele é os dois, tenta ganhar o pão de cada dia nessa vida difícil.
    Pena as crianças terem que passar por isso, não pediram para nascer.
    Tenha uam semana especial.
    Com carinho, Lady.
    Bj

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  9. Olá..boa noite!

    Que história de vida a do Nelson hein! Muito bem contada por você!
    Acredito que ele se encaixa bem como "empresário brasileiro",acho que o que ele faz não é pedir esmola.
    Eu sou contra dar esmolas.
    Acho que dar roupas e contribuir com alguem que faz o que o Nelson faz é algo bem diferente de dar esmolas.

    Parabéns pelo blog, gostei e voltarei sempre!!
    Bjss!

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  10. Paulo, caríssimo!

    Eu penso e acho que, o nosso amigo Nelson,
    além de ser um militante brasileiro, é também
    um cara muito legal e esperto.

    Afinal, ele é brasileiro genuíno.

    "Aproveito a vida ao máximo, e nunca estou sozinho, pois sempre levo um corpinho diferente para casa"
    (palavras dele, algo a contestar?) risos.

    Bjos meu querido, bjinhos a princesinha.

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  11. Oi Paulo!
    Antes de mais nada, obrigada pela passagem no meu "território"(rsrsrs) e pelas palavras que vc deixou por lá!

    Fui lendo seu post e pensando em tudo que sempre dizemos a nós mesmos pela vida a fora: vou trabalhar, ganhar uma grana, ter uma família, me estabilizar legal e depois eu quero mais é "enxugar tudo" e curtir a vida !
    Vai saber que tipo de passado esse Nelson teve em toda a sua trajetória. Foi metalúrgico, carteira assinada, família...não sei!
    De repente, nada deu muito certo e ele "enxugou tudo" e foi viver " a vida só de amor".....rs

    Aposto que ele não tem gastrite, sindrome do pânico, depressão e nem toma remédio pra dormir!
    Uma coisa é indiscutível: o Nelson leva um dia de cada vez e passa para seus filhos a verdade absoluta de sua vida.
    Parece-me que isso já basta para alguém se sentir bem.

    Quantos de nós já pensamos em ser um "Nelson" na vida e fugir de tantas burocracias e responsabilidades que fomos assumindo?

    É, a vida do Nelson só cobra uns trocos de pensão alimentícia.

    Legal....seguindo vc também !

    beijos

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  12. Olá, Paulo,
    E quantos Nelson tem por aí, não é?
    Cada um com as suas vidinhas cheias de histórias, com algumas excentricidades, mas todas se encaixando num cantinho desse nosso mundo de "navegadores" aprendizes.
    Ótimo texto!

    Beijos pra ti e boa semana!

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  13. Olá Paulo
    Interessante e bem contada a história do Nelson. Acho que ele é um típico trabalhador brasileiro, mas com poucas responsabilidades. Não pede esmolas. Deve sim, ser ajudado por nós, agasalhos, etc. Não é empresário porque então já estaria falido com a quantidade de impostos que teria de pagar ao governo. Ele que continue com sua cervejinha e sustentado sua prole. E que não ponha mais filhos no mundo, senão...
    Bjssssssssss

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  14. Oi,Coleguinha! Gostei de "te ler"!beijinhos
    Maure

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