domingo, 31 de maio de 2009

Um homem iluminado chamado R.M.



Às vezes, existem pessoas que chamam muito a minha atenção, pessoas a qual eu conheço muito, pouco, e muitas vezes nem as conheço, mas que se fazem notar.

Hoje, vou escrever sobre uma dessas pessoas, a qual vou me referir pelas suas iniciais, por razões óbvias.

R.M. é um colega, engenheiro eletrecista, muito inteligente, um excelente profissional, casado, pai de dois filhos lindos, e uma pessoa de bom coração. Aliás, todo o ser humano tem seu lado bom e seu lado ruim, mas nunca conheci o lado ruim de R.M, até porque meu relacionamento com ele sempre foi muito mais profissional do que pessoal. Ele é dessas pessoas que os outros em geral chamam de carola ou de fanático religioso, pois é visto a todo momento com uma Bíblia Sagrada na mão, e seu assunto se resume basicamente à religião. Em qualquer papo ele cita um versículo da Bíblia e tenta doutrinar seu interlocutor. É uma pessoa de poucos amigos, e é visto frequentemente isolado lendo a Bíblia, mesmo no seu local de trabalho.

No mural do corredor, no nosso local de trabalho, sempre tem uma mensagem de fé e esperança colocada por ele, e no seu carro tem um adesivo no vidro que diz: PROPRIEDADE DE JESUS.

Já tive oportunidade de fazer alguns trabalhos com ele na engenharia, e lembro-me que sempre que saímos de uma obra juntos, ele me dizia para eu esperar um pouco lá fora, e voltava para o interior da obra para distribuir "santinhos" com mensagens para os peões. De uma certa forma, é o seu trabalho de envagenlização.

As pessoas, em geral, não gostam de viajar à trabalho com ele, pois seu papo, como já disse, se resume a religião, sempre tentando converter as pessoas. Eu particularmente gosto, pois entendo que ele tem um alto grau de conhecimento sobre o assunto, e respeito todas as religiões que são sérias. Sua igreja é evangélica e Batista, e parece-me uma igreja séria.

Acho que pelo fato de respeitá-lo e escutá-lo sempre com um certo interesse, ele tem a esperança de um dia converter-me à sua igreja. Para isso, já tentou inúmeras abordagens, as quais eu sempre consegui me sair bem, sutilmente e com muita delicadeza. Um dia, por exemplo, ele queria que eu fizesse um trabalho de engenharia para ele, um laudo sobre uma estrutura do prédio da sua igreja, mas teria que ser no sábado pela manhã, antes do horário do culto, para que eu já ficasse no culto. Dei uma desculpa, e acabei fazendo o trabalho para ele, mas em outro horário. Sempre me saí de uma forma sutil para ser educado. Como já disse, apesar de ser católico, respeito todas as religiões sérias e que fazem um trabalho social bonito.

Eu comecei a admirar R.M quando descobri um dos trabalhos sociais que ele realizava. Todos nós temos uma hora de almoço, e as pessoas sempre almoçam em pequenos grupos. R.M almoça sempre sozinho, em 30 minutos, geralmente um sanduíche para não perder muito tempo, e os 30 minutos restantes, todos os dias, sai com sua Bíblia na mão, que já está bem surradinha de tanto manuseio e leitura, e vai visitar as pessoas doentes, aquelas que geralmente estão em estado terminal, em dois hospitais próximos dali. Isso ele faz, religiosamente, todos os dias.

Acho esse trabalho fantástico, pois ele leva um pouco de conforto espiritual àqueles que não tem mais esperança e ninguém que os visite. Que trabalho maravilhoso! Me sinto um ser insignificante perto daquele homem.

Todos os dias, em uma pequena escada de três degraus que leva a um portão de ferro que acessa a um jardim de recuo do prédio da empresa, fica sentando um mendigo, daqueles todo esfarrapado, barbudo, tão sujo que a pele chega a ser morena, apesar de ser um homem branco. Geralmente, está dormindo com uns trapos, abraçado a uma garrafa pet, a qual eu desconfio que muitas vezes seja álcool puro. Nunca vi esse homem acordado, apesar de estar sempre respirando. Ele deve sobreviver graças a algumas almas iluminadas como R.M, que devem dar-lhe comida e até a cachaça, pois um homem nesse nível de alcoolismo necessita de cachaça para viver.

Recentemente, saí um pouco mais tarde do serviço, já havia anoitecido, e vi uma cena que, simplesmente, me deixou abismado. O mendigo estava acordado, e R.M. estava sentado ao seu lado, conversando com ele. Pensei no que R.M. deveria estar dizendo para aquele mendigo. Provavelmente, que existia um Deus que o amava muito e que ele tinha uma esperança na vida, enfim, estava dando uma palavra de conforto para sua alma.

Fiquei dias pensando sobre isso. Vi que ainda tenho muito que crescer espiritualmente. Que tenho que me aproximar mais de Deus e reavaliar minha vida, mais do que eu realmente imaginava. Que compaixão pelo próximo é algo tão lindo, que faz mais bem a você do que aos outros, e que você só consegue fazer um trabalho social assim ser tiver Deus no coração.

Às vezes, nos preocupamos com coisas tão pequenas, tão fúteis, com nossos orgulhos, como se fóssemos o centro do mundo, que nos esquecemos de ter amor e tentar compreender sequer as pessoas que nos amam verdadeiramente.

Eu sei que R.M. está em um outro estágio de crescimento espiritual, e que talvez eu e 90% das pessoas nunca iremos chegar a esse estágio.

Mas exemplos assim, é que nos devem inspirar para sermos seres humanos melhores.

Como dizia um professor de Cálculo Infinitesimal na faculdade de engenharia da U.F.R.G.S, após encher a lousa como uma complicada demonstração matemática: "EMBARAÇA PELA SIMPLICIDADE".

A felicidade deve ser assim: "É TÃO SIMPLES QUE A ACHAMOS MUITO COMPLICADA".

O mundo precisa de mais pessoas como R.M.

2 comentários:

  1. Lindo texto, primo!Beijão

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  2. Paulo,
    Ao sentimento revelado por R.M. se chama "solidariedade". Sentimento, por vezes, às vezes, muitas vezes esquecido e, banido do quotidiano da vida de muitas gentes.
    Um sentimento que se traduz por dissemelhantes trajos. Os exemplos de solidariedade e, compaixão pelos nossos semelhantes trajado no seu blogue, denotam, uma grandeza e, uma profundidade difícil de igualar. E, sabe Paulo?! O seu blogue permitiu a si, e, naturalmente a quem teve o privilégio de o ler a possibilidade de relembrar que urge nos dias de hoje o renascimento desse sentimento adormecido no lado esquerdo do nosso peito. De facto, o mundo precisa de mais pessoas como R.M., pessoas como você e, eu. Pessoas que não conseguem ficar indiferentes à negligência de viver cada dia, sem o manifesto da “solidariedade”, presente.

    Um delicado dia para si.

    Ana

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